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MB festejando sua vitória em 2016
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Na disputa do último
domingo, 15, Dudy (PSD) superou Marcelo Brandão (DEM) com uma diferença de 6.094
votos, e será o novo prefeito de Ipirá a partir de janeiro de 2021.
“O padeiro amassou o
doutorzinho!”, assim diz a letra da música que embalou a vitória do candidato
da coligação “Tem que ser agora, Ipirá!”. A “lapada” desbanca a “marreta” num
resultado histórico para Ipirá, que jamais será esquecido, assim como as
promessas de transformação administrativa frustradas pela crueza dos fatos, em
meio aos desencontros entre conversa bonita e realizações.
Há anos que a população de
Ipirá – e região – estava acostumada a ouvir pelo rádio, discursos políticos
bem articulados, invariavelmente com alfinetadas sobre os desmandos e falhas de
gestão dos governos, através da pessoa do atual prefeito, que agora prova desse mesmo veneno, ao
esbarrar nessas agruras do poder, de forma impiedosa.
A comunidade ainda estarrecida
com tamanha rejeição, com o não avassalador a um candidato pelo escrutínio
popular, assiste a algo que não tem sido comum ultimamente na cidade. A derrota
do atual prefeito quebra uma escrita de reeleições nos
últimos anos, a exemplo da vitória do hoje líder político Luís Carlos, por um
lado, nas eleições de 2000, e, por outro lado, o também líder político,
Diomário, nas eleições de 2008.
Ainda que as pesquisas
indicassem vitória de Dudy, nem o mais otimista eleitor se arriscaria a bancar
uma diferença tão impactante, tendo em vista a força dos dois maiores grupos
políticos locais. Isso mostra sinais claros e gritantes da maior repulsa que se
tem conhecimento a uma pessoa pública, e sobre o modo que esta escolheu, de
fazer política em Ipirá.
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MB com a marreta símbolo de sua campanha em 2016
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Qualquer prognóstico acerca
das eleições aqui, deve ser feito com o máximo de cautela. Marcelo Brandão
vivenciou os dois extremos, deixou de ganhar por pouco em 2012 e perdeu por
muito agora. A disputa de oito anos atrás também é inesquecível, ela foi
decidida por apenas 49 votos, quando se esperava um resultado diferente, muito
em razão de desgaste do grupo que então estava no poder, por diversas
circunstâncias, inclusive mudança de candidato a poucos dias das eleições.
Marcelo Brandão agora volta a protagonizar em cenário bem diferente.
O insucesso do atual chefe do
Executivo vai na contramão do aumento da média registrada Brasil afora nas
eleições desse ano, onde a taxa de reeleição de prefeitos foi a maior em 12
anos, pois 63% dos candidatos que tentaram a reeleição, obtiveram êxito. O
índice de 2016 registrou um total de 46%.
A diferença de 6.094 foi
surpresa também para o atual prefeito, que reconheceu em mensagem nas redes
sociais. O atual gestor agradeceu o empenho dos que foram à luta e atribuiu o
resultado a “tanto interesse pessoal”. Disse que fizeram o que estava ao
alcance e se colocou às ordens dos amigos.
Custa acreditar, porém, que
nesse tempo de gestão o prefeito tenha feito o possível pelo Mercado de Artes,
só para ficar nesse exemplo que é um símbolo para a cidade, e da gestão também.
Prestes a completar 4 anos que sofreu o incêndio, e já com um projeto pronto,
que tornaria a praça José Leão dos Santos a “mais bonita da região”, como costumava
dizer o prefeito, foi apresentado dias antes da eleição um verdadeiro arremedo
da tão preconizada requalificação que era a palavra de ordem da gestão, numa
tentativa fracassada de impressionar, uma vez que a obra está inacabada, pois o
que se viu foi uma reestruturação do exterior, sem o necessário trabalho de
reparo em seu interior, foco de toda a destruição.
Vale lembrar também que a
reforma da praça São José (“Puxa”) se tornou uma prioridade muito questionada à
época, que depois de muita espera foi entregue, diga-se de passagem, com a
moderna biblioteca ainda oca, sem livros, que assim permaneceu por um bom
tempo.
Outro episódio que marcou essa
reta final de campanha, e que provocou enorme repercussão, foi a reação ao evento
realizado pela igreja católica, para ouvir propostas dos três candidatos a
prefeito de Ipirá, no último dia 31 de outubro. Parecia um prenúncio do
resultado das urnas nesse domingo, dia 15.
Naquela ocasião, a turma
sectária do atual prefeito inquietou-se nas redes e demonstrou surpresa,
inclusive o próprio prefeito, que ao final teceu comentários em tom de
desapontamento com o modelo de apresentação de ideias escolhido, isso ainda depois
de ter sido combinado e aceito antecipadamente pela equipe de apoio. Ficou
parecendo o último gás, no último round, de um adversário combalido, em busca
de uma improvável reviravolta na luta, querendo usar do artifício da oratória
para convencer. Tarde demais.
Tudo isso para falar mais do
mesmo, com um discurso previsível e redundante, que certamente reportaria o
eleitor ao passado, mais do que propriamente ao futuro. O que os mais exaltados
queriam era mais um ensaio verborrágico que reafirmasse o encanto onírico de
desenvolvimento local que, de repente, pudesse maquiar a ladeira abaixo que o
prefeito estava enfrentando àquela altura.
Aqueles que foram às redes
atentar contra a própria igreja católica, idealizadora do evento, através da
paróquia Senhora Santana, alguns até questionando seus valores e intenções com
a proposta de apresentação das ideias de governo dos três candidatos, mais
queriam ver triunfar o engodo palavroso sobre a clareza dos acontecimentos
recentes.
Muitos eleitores, iniciantes
pouco familiarizados com os artifícios da vida política, são “conquistados”
pela arte da persuasão do discurso político. Assim, quem fala bonito
e com boa desenvoltura, leva certa vantagem, sem dúvida, mas não o tempo
inteiro. O resultado das urnas nesse último domingo mostra o quão essa prática
se confirmou infrutífera. Serviu bastante para municiar ainda mais a população,
conscientizando-a de que se não presta, a mudança de rumo é o caminho mais
natural.
O atual prefeito sempre se
valeu desse atributo, foi alçado ao cargo por muito questionar no rádio as
práticas e (in)decisões administrativas municipais, tendo um número
significativo de pessoas como ouvintes, durante anos. Porém, curiosamente,
sofre a derrota muito em virtude de sua fragorosa desarmonia entre discurso e
prática.
Não obstante, vale refletir
sobre a insistência de seu marketing na tecla dos 12 anos da gestão anterior,
como forma de tentar sobressair com muito pouco a mostrar de seu próprio
governo. Isso se revelou cansativo e enfadonho. Na linguagem das gírias, isso
se tornou conversa mole, lero-lero. Marcelo Brandão, atuando como radialista,
arrotava que a prefeitura de Ipirá tinha uma arrecadação em torno de
R$10.000.000,00 mensais (dez milhões de reais mensais!) e que muito pouco era
feito pela cidade com esse dinheiro.
Para o atual prefeito, fica
até desconfortável tirar uma hora da manhã para ir ao rádio falar sobre
administração pública novamente. Tal como é muito precipitado cravar o perfil
da próxima gestão, é muito incerto se o atual prefeito voltará em alta
performance como locutor analista da conjuntura política local, nos dias que
não participar de audiência, palpitando sobre o que, o onde, o como e o porque
as coisas são como são no próximo governo de Ipirá, com o mesmo ímpeto de antes.
A era pós Marcelo Brandão abre
um novo horizonte na política local, ao revelar que a arte de falar bem não se
sustenta por muito tempo nesse mundo conectado em que vivemos, onde o debate
vai muito além daquele que ele estava ávido por acontecer com o principal
adversário na disputa, pois a todo instante milhares estão debatendo o mundo
que nos cerca. Daí que os milhares de frente na urna não precisaram assistir
ao confronto de poucos minutos, num único evento, para tomar a decisão
depois do que sucedeu durante 3 anos e 10 meses.
A chave de sucesso para a
próxima gestão, seguramente não passa pelo aperfeiçoamento no poder de fala de
quem estará lá na cadeira de prefeito nos próximos quatro anos. É preciso, sim,
que faça a máquina pública andar gerando frutos que atendam aos anseios da
coletividade. Ficou muito cristalino que o quantitativo estrondoso de votos
favorável à mudança, contou com muita gente que “pulou”, como se diz
popularmente, mas também não se pode negar que um bom número dessas pessoas
simplesmente não digeriu bem o perfil de governo que se apresentou depois de
tanta conversa desconexa.
Diante de todo o
cenário de momento, ficam lições e mais lições que todos aqueles diretamente
envolvidos certamente saberão lidar de forma mais cuidadosa. O imponderável
mostrou sua força nas eleições municipais de Ipirá nesse ano, que já é atípico,
e deixou fortes sinais de que não custa muito a provocar novas surpresas com os
protagonistas do jogo político que menosprezarem demais suas regras.
Por Diogo Souza (Graduado em Comunicação Social / Jornalismo - Uesb e formando em Direito - Uefs)