Governo fala em 'árvore podre' e aposta em anulação de provas
'Flechas do Janot amoleceram', disse um ministro da
cúpula do governo
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O presidente Michel Temer participa de reunião do Brics - Fred Dufour / Pool/Reuters |
BRASÍLIA — Ainda assimilando os novos fatos que envolvem
o acordo de colaboração premiada de empresários da JBS, interlocutores próximos
ao presidente Michel Temer acreditam que a reviravolta no caso, divulgada nesta
segunda-feira pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, inviabiliza
qualquer prova colhida contra Temer, ainda que Janot tenha reiterado, na fala à
imprensa, que as informações permanecem intactas.
Alguns de seus principais ministros falam na delação do empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS, como uma "árvore podre", com o potencial de contaminar não só as provas, mas também a primeira denúncia, já derrotada na Câmara dos Deputados, e uma eventual segunda denúncia que o procurador pode apresentar nos próximos dias.
— É a teoria da árvore podre, que contamina tudo. As
flechas do Janot amoleceram — afirmou um ministro da cúpula do Palácio do
Planalto.
Apesar do cenário favorável para Temer, não há, nos
corredores do Palácio, um clima de euforia e de "já ganhou".
Auxiliares do presidente afirmam, por exemplo, que caso uma nova denúncia venha
a público, o trabalho junto aos deputados deverá ser feito com o mesmo cuidado
de sempre, ainda que o clima tenha melhorado para o governo.
— Resolvido nunca está, sempre é difícil, mas realmente
facilita muito o nosso trabalho. O clima mudou totalmente na Câmara — admitiu
um interlocutor.
PLANALTO DIZ QUE JANOT ESTÁ SE PROTEGENDO
O Palácio do Planalto também prega que Janot estaria se
protegendo e dificultando que a sucessora Raquel Dodge investigasse o caso,
inclusive contra o próprio procurador.
— Janot está tomando uma ação preventiva a pouquíssimos
dias de sair da PGR, para que Raquel Dodge não tome providências, inclusive
contra ele. É coincidência esse anúncio às vésperas do fim do mandato? —
ironiza outro auxiliar do presidente, que aposta na anulação das provas. Janot
deixa a chefia do Ministério Público no próximo dia 17.
Esse auxiliar de Temer cita o pronunciamento do
presidente um dia depois da denúncia de Janot, em que ele atacou diretamente o
procurador Marcelo Miller. A PGR respondeu a fala de Temer com uma nota,
reafirmando a legalidade das provas, e reiterando que Miller não havia
negociado a delação da J&F, holding controladora da JBS.
— O cidadão saiu (da PGR) e já foi trabalhar, depois de
procurar a empresa (JBS) para oferecer serviços, foi trabalhar para esta
empresa e ganhou, na verdade, milhões em poucos meses — disse Temer à época,
enfatizando que Miller era da "mais estrita confiança" de Janot.
Com a reviravolta gerada por uma nova gravação dos
delatores da empresa, o acordo de colaboração premiada pode ser revisto. Isso
aconteceria por conta do suposto favorecimento de Miller, que trabalhava com
Janot, aos colaboradores, e da suposta omissão de crimes por parte dos
empresários.
Fonte: O GLOBO
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No STF, ministros já falam em questionar validade de delação da JBS
Fachin vai esperar apuração de Janot; Cármen fala em
‘agressão inédita’
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Plenário do Supremo Tribunal Federal - Ailton de Freitas / Agência O Globo |
BRASÍLIA — No dia seguinte à notícia de que o procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, decidiu apurar a idoneidade do acordo de colaboração premiada da
J&F, admitindo rever benefícios de delatores, ministros do Supremo Tribunal
Federal (STF) começaram a questionar a validade das provas apresentadas pelos
executivos do grupo. Ao menos dois magistrados querem que o relator dos
inquéritos abertos no STF a partir da delação, Edson Fachin, leve a discussão
ao plenário. A intenção é determinar o quanto antes se depoimentos e provas dos
delatores podem subsidiar inquéritos — entre eles, o que mira o presidente
Michel Temer.
A presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia, chamou Fachin para conversar logo pela manhã e teria mostrado preocupação com o teor dos áudios, que respinga no STF quando executivos citam ministros. No fim do dia, a ministra gravou uma declaração em vídeo para defender o tribunal e comunicar que pediu à PGR e à Polícia Federal uma investigação sobre as menções feitas pelos delatores a integrantes da Corte. Segundo ela, as citações afetam a “honorabilidade” dos ministros e representam uma agressão inédita na História do Brasil.
— Ontem, o procurador-geral da República veio a público
relatar fatos que ele considerou gravíssimos e que envolveriam este Supremo
Tribunal Federal e seus integrantes. Agride-se, de maneira inédita na História
do país, a dignidade institucional deste Supremo Tribunal Federal e a
honorabilidade de seus integrantes — afirmou Cármen Lúcia. — Impõe-se, pois,
com transparência absoluta, urgência, prioridade e presteza, a apuração clara,
profunda e definitiva das alegações, em respeito ao direito dos cidadãos
brasileiros a um Judiciário honrado — acrescentou Cármen.
Se as provas apresentadas pela JBS forem consideradas
contaminadas pelas supostas irregularidades e, por consequência, anuladas, os
inquéritos ficarão desidratados e terão pouca chance de prosperar. Fachin já
teria manifestado vontade de julgar a questão em plenário. Mas, por enquanto,
ele ainda está examinando o material. O ministro falou ontem com alguns colegas
sobre o assunto. Antes de tomar qualquer providência, entretanto, Fachin vai
aguardar o término das apurações da Procuradoria-Geral da República (PGR).
PGR VAI COLHER DEPOIMENTOS
Depois de ouvir os depoimentos dos delatores e do
ex-procurador Marcello Miller, que teria atuado a favor dos executivos, segundo
as gravações entregues pela própria JBS (leia trechos na página 6), a PGR vai
concluir se houve ou não irregularidade no acordo de delação. Em nota ontem,
Miller afirmou ter “convicção de que não cometeu qualquer crime de improbidade
administrativa”. E disse estar à disposição das autoridades para prestar todos
os esclarecimentos.
Entre os ministros, a preocupação é que não há ainda uma
jurisprudência do tribunal recomendando como agir diante de irregularidade em
delação premiada — mesmo porque o próprio tema delação é novidade na mais alta
Corte do país. Um dos ministros defende que os documentos e provas apresentados
pelos delatores sejam considerados nas investigações do Supremo Tribunal Federal.
No entanto, os depoimentos prestados deveriam ser anulados. Essa seria uma
solução intermediária que esvaziaria as investigações, mas deixaria alguma
esperança de que elas ainda pudessem chegar a algum lugar.
— Não tem precedente. O tribunal tem que construir —
avaliou um ministro.
Na visão da PGR, quando uma delação é acertada de forma
irregular, apenas os benefícios do depoente devem ser anulados, e não as provas
apresentadas. Segundo um procurador que atua no caso J&F, não é possível
aos investigadores examinarem provas aparentemente idôneas e, depois,
ignorá-las.
— Agora não podemos fingir que não vimos nada — afirmou
esse procurador da República.
A delação premiada da J&F contém cláusulas que tratam
especificamente da rescisão do acordo. Um item diz que, “em caso de rescisão
por sua responsabilidade exclusiva, o colaborador perderá automaticamente
direito aos benefícios que lhe forem concedidos em virtude da cooperação com o
Ministério Público Federal, permanecendo hígidas e válidas todas as provas
produzidas, inclusive depoimentos que houver prestado e documentos que houver
apresentado, bem como válidos quaisquer valores pagos ou devidos a título de
multa”. O STF teria que decidir se essa cláusula pode ser mesmo aplicada.
JOESLEY DIZ QUE MENTIU
Segundo outro item, o acordo perderá efeito “se o
colaborador mentir ou omitir, total ou parcialmente, em relação a fatos
ilícitos que praticou, participou ou tem conhecimento”. Essa cláusula poderia
ser aplicada a Ricardo Saud, que declarou somente na semana passada manter uma
conta no Paraguai. “Essa informação precisa ser aprofundada”, escreveu Janot em
despacho de segunda-feira.
Na noite de terça, Fachin determinou o fim do sigilo dos áudios da conversa.
Considerou que, como os próprios executivos já tinham enviado à PGR, não havia
mais motivo para o material ser mantido em segredo.
O ministro Gilmar Mendes chamou Janot de “desastrado” e o
acusou de querer envolver a ele e toda a Corte no episódio da delação de
Joesley Batista:
— Eles tentaram arrastar o STF para a lama em que eles se
meteram. Essa atitude tem que ser repudiada. Ele (Janot) armou isso para
atingir o STF. A PGR virou, com Janot, uma mula sem cabeça. O que ele tentou
fazer no episódio revela sua total falta de escrúpulo — acusou Gilmar.
Em uma nota divulgada no fim do dia, Joesley e Ricardo Saud pedem desculpas e dizem que
mentiram na conversa: “Esclarecemos que as referências feitas por
nós ao excelentíssimo senhor procurador-geral da República e aos
excelentíssimos senhores e senhoras ministros do STF não guardam nenhuma
conexão com a verdade. Não temos conhecimento de nenhum ato ilícito cometido
por nenhuma dessas autoridades. O que nós falamos não é verdade, pedimos as
mais sinceras desculpas por este ato desrespeitoso e vergonhoso e reiteramos o
nosso mais profundo respeito aos ministros e ministras do STF, ao
procurador-geral da República e a todos os membros do Ministério Público”.
Fonte: O GLOBO
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