Para cinco mil famílias no Brasil, a sala de aula é dentro de casa
Falta de adaptação ou escola ruim levam pais a optar pelo ensino em casa. Mas não matricular filhos em escolas pode criar problemas com a Justiça.
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Foto: imagem ilustrativa |
Pelo menos cinco mil famílias
brasileiras trocaram a escola formal dos filhos pelas aulas em casa. Mas várias
delas acabaram processadas. O assunto foi parar no Supremo Tribunal Federal.
A sala de aula não fica numa
escola. Ana Júlia, de 10 anos, estuda em casa, com a mãe. Os irmãos, Ricardo,
de 7 anos, e Sophia, de 4, também. Tudo começou porque Ricardo não
se adaptava às aulas na escola. Milene virou professora do filho durante um
semestre e achou o resultado muito melhor.
“Quando vi no final do ano toda aquela
evolução, falei: não é possível que tenha sido por acaso”, contou a
fisioterapeuta Milene Góes. No ano seguinte, foi a vez de a
Ana Júlia sair da escola. “Eu vi que era totalmente
possível também ela ter uma educação mais personalizada, uma educação
direcionada conforme as necessidades dela”, explicou Milene.
Para a família da Milene e para
muitas outras no Brasil, a escola não é o único lugar onde os filhos podem ter
aula, aprender, receber o que a gente chama de educação formal. Pode ser por dificuldade de
adaptação da criança em uma sala de aula cheia de gente ou porque os pais
consideram que a escola é ruim e que o resultado em casa pode ser melhor.
Mas a decisão de não matricular
os filhos numa instituição de ensino é polêmica, divide os especialistas e pode
criar problemas com a Justiça. Na Constituição brasileira está
escrito que a educação é um direito de todos e um dever do estado e da família.
“O estado não pode proibir um
pai, uma mãe de educar seu filho fora dos muros escolares. O que desejamos é a
autonomia educacional da família. Que a família tenha a prerrogativa de decidir
se coloca os filhos na escola ou se os educa fora da escola”, disse Ricardo
Dias, presidente da Aned.
Mas se a Constituição dá margem à
discussão, as leis que tratam desse assunto não dão: para o Estatuto da Criança
e do Adolescente, não matricular os filhos é descumprir os deveres inerentes ao
poder familiar. E o Código Penal diz que é crime
de abandono intelectual deixar de prover a instrução primária de filho em idade
escolar.
Das cinco mil famílias que educam
os filhos em casa, 60 já tiveram problema com a Justiça. Mas nenhuma foi
condenada por abandono intelectual. O impasse acabou na mais alta
corte do país. O Supremo Tribunal Federal deve analisar em breve o caso de uma
família que está sendo processada por não levar os filhos para a escola. A decisão dos ministros pode
confirmar a obrigatoriedade da matrícula ou abrir um precedente para permitir o
ensino em casa.
Luciane Muniz Ribeiro Barbosa,
professora de educação da Unicamp acredita que a educação domiciliar só poderia
ser admitida com o acompanhamento do estado, para assegurar o aprendizado da
criança. É assim que acontece nos Estados Unidos e no Canadá, por exemplo.
“Há um registro feito por essas
famílias ou nas escolas ou na diretoria de ensino. Na minha avaliação, a gente
precisa que o estado supervisione se, de fato, essas crianças estão tendo
educação”, disse.
O ex-ministro da Educação Renato
Janine é contra o ensino apenas em casa. Para ele, a socialização que a escola
promove é fundamental para toda criança. “Educar é tirar a pessoa do mundo fechado e levar para o mundo aberto com toda
a sua diferença. Educar é abrir para o mundo. Então é muito importante que,
desde cedo, a criança perceba que o mundo tem uma diversidade muito grande e
que essa diversidade seja uma promessa, uma oferta, não uma ameaça”, afirmou.
Fonte: G1
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